sexta-feira, 30 de maio de 2014

Se eu não entender, não vou responder, então eu escuto


Eu não conhecia o básico do francês quando cheguei em Québec. Começava a jornada em que escutar era mais importante que falar. Era a melhor opção.

Eu não sei dizer
Nada por dizer
Então eu escuto

E naquela cacofonia de sotaques, erres e bicos eu me sentia perdido. Aqui e ali uma palavra semelhante ao português ou ao inglês me dizia que aquele era um idioma mais próximo do que distante.

Se você disser
Tudo o que quiser
Então eu escuto
Fala

Alguma coisa está acontecendo, mas você não sabe bem o que é. A sensação de isolamento te deixa meio alienado. Decisões sendo tomadas, opiniões externadas, piadas proferidas, risos e você lá... Apenas lá.

 lá, lá, lá, lá, lá, lá. lá, lá, lá
Fala

Estar num lugar onde não se entendo o que está sendo dito é um exercício de humildade. Com o tempo e o esforço, você começa a entender. Mas aí vem o maior desafio: Falar!

Se eu não entender
Não vou responder
Então eu escuto

Como é difícil querer dizer algo e não encontrar o vocabulário, faltam verbos, sobram frustrações.

Eu só vou falar
Na hora de falar
Então eu escuto
Fala

Aujourd'hui je peux me communiquer en Français. Mais c'est tard. J'écoute plus que je parle.

lá, lá, lá, lá, lá, lá, lá, lá
Fala
Parles-toi


P.S. A música Fala dos Secos & Molhados, com sua simplicidade e profundidade, pode ser usada em vários contextos, mas aqui ela define um ano e meio de vida num meio francófono. 


quarta-feira, 21 de maio de 2014

Portenhos, parisienses e cariocas

- Quem fala assim são os portenhos, nós não queremos falar como eles. Definitivamente, não!

- Ah, detesto esse tipo de comportamento. Isso aí é em Paris, em Nantes não é assim... Na verdade, para os parisienses eu sou uma camponesa. Não vejo problema nisso, se não fosse dito de maneira pejorativa.

- O Brasil não é um país de samba, praia, futebol e mulheres dançando. Essa visão não nos representa.

A primeira frase foi dita por uma argentina, a segunda por uma francesa e a terceira é exaustivamente dita por mim!

De onde vem a reputação que alguns países tem? O argentino metido, o francês arrogante e o brasileiro festeiro?

Percebo, morando fora do país, que a imagem do brasileiro é deturpada e quase sempre associada à uma caricatura do carioca do século passado. E por mais que muitos brasileiros não concordem e não reforcem essa imagem, pensam parecido quando falam de outros estrangeiros. Buenos Aires e Paris são capitais de países com forte diversidade interna. Quem já viveu em qualquer metópole sabe o que é conviver com poucos sorrisos, muita pressa e grande oferta de diversão. Mas daí a pensar que isso representa um país é, no mínimo, uma generalização grosseira. Nisso, somos muito mais parecidos que diferentes. 
Há um tempo que penso que a "identidade" brasileira é muito mais carioca do que de fato brasileira. Em um dado momento (que não sei precisar) tudo que era carioca tornou-se nacional e o que não era, recebeu o rótulo de regional. Isso persiste até hoje, ou não seria o forró um estilo musical regional enquanto a bossa nova é nacional?

Transpondo para outros países, precisamos fazer um exercício constante de não generalização e buscar conhecer mais os outros.

Aprendi que o argentino não é o portenho, o francês não é o parisiense e o brasileiro não é o carioca. E eu não sei o que são...

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